sexta-feira, março 18, 2005

8 de agosto de 2001

daqui consigo ver um muro, uma árvore que aparece detrás do muro que está a secar, em cima da árvore vejo um azul. será o céu? ou será o mar? Parece o céu. no céu de vez em quando passa um peixe... desculpem, um pássaro. este pássaro que agora aqui passou leva comida para dar ao filho, essa comida chama-se Pila e é uma minhoca. sem ironias, é mesmo uma minhoca a quem os pais minhocas deram o nome de pila. pila vai na boca do pássaro que quer alimentar os seus filhos, que estão esfomeados, e não têm tido comida nem bebida, devido a este tórrido calor.
e eu continuo aqui sentado, ao sol, encostado à parede da minha casa, num típico retrato dum monte alentejano, a ver o pássaro fugir com a pila na boca.
não me apetece ir para dentro, não me apetece sair daqui, só me apetece ficar aqui sentado a levar com o sol na cara, a ver acontecer o momento.

estou aqui na casa do meu avô, a minha avo já não está entre nós, está entre outros, entre outra família, está lá em cima, em trás os montes, deixou o meu avô aos 65 anos, quando se reformou. fugiu com outro e foram curtir a reforma. estou aqui só eu e o meu avô e o meu pai. é uma seca.
quem me dera ser um miúdo normal, mas não sou, sou um miúdo estúpido, sou diferente. ser diferente implica ser estúpido. não é um sinonimo, mas devia ser. imaginem só: um miúdo diferente como eu, que calça o 43 ao 15 anos, veste camisolas de gola alta vermelhas, justinhas, calça de Lycra azul e botas pretas, isto só por querer sentir-se bem, é considerado um estúpido, ou um atrasado mental, ou simplesmente esquisito. mas terá que ser eternamente? não pode um miúdo como eu ser feliz à sua maneira? quem me dera ser uma pila, estar na boca de um pássaro pronto a devorar-me. queria morrer, para sentir o que se sente após estar morto, nada. devia ser bom, estando morto não sentiria nada, nem ciúme, nem orgulho, nem vergonha, nem seria gozado, sentiriam a minha falta, falavam de mim. quero morrer, vou morrer e depois, lá do meu buraco vou fazer escavações até à casa de todas as pessoas que conheço e ouvir o que dizem de mim após estar morto. se disserem bem volto, se disserem mal deixo-me estar onde estou.

um bom sitio para morrer seria conduzir embriagado, mas não tenho carta, mas também se quero morrer o que isso interessa? só quero morrer, não quero ser apanhado pela policia. é isso vou conduzir por essas estradas fora e vou ter um acidente. eu sei conduzir, o meu pai tem-me andado a ensinar a guiar, vou morrer, yupi!
o carro está na garagem, mas as chaves não. as chaves estão na mesa da cozinha. boa!
como se guia? deixa lá ver. embraiagem, mudanças, volante... acho que já domino.
arranco por essas estradas fora, quero sentir a adrenalina e depois morrer. já vou a 50km/h, se balançar o volante repentinamente talvez tenha um despiste. mas não. acelero.
já vou a 120, o carro está a fazer mt barulho, só sei por até a 3ª mudança. isto não dá pica, quero morrer já.
mas eu quero ainda lutar por alguma coisa que valho, quero lutar pela supremacia dos meus valores, quero estudar, ir para a universidade, tirar um curso de artes e viver sozinho, num sótão com uma divisão onde estude, trabalhe, pinte, escreva, dance, corra, mergulhe no céu... no mar.
é isso, não vou morrer ainda. vou parar o carro. do outro lado da estrada está um telefone, vou telefonar ao meu pai e pedir que me venha buscar...

...tarde demais a minha decisão. fui atropelado por um camião e todas as suas rodas contaram o meu rosto. eram miolos por todo o lado, nem eu me reconhecia.

2 comentários:

xp disse...

Parece-me que já ouvi esta estória em algum lado...

Anónimo disse...

Alguma "copiador" q me copiou.

Eles andem aí

Visitas aqui ao cú mulo da parvoíce a partir de 11/09/2007 porque perdi o outro antigo

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